TST ANULA ACORDO TRABALHISTA POR SIMULAÇÃO PARA BLINDAGEM PATRIMONIAL.
Colegiado reconheceu que a empresa utilizou de ação trabalhista de forma simulada para proteger patrimônio em prejuízo de credores.
A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do TST acolheu ação rescisória ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho e anulou acordo firmado entre ex-empregada e metalúrgica. O colegiado entendeu que a ação trabalhista foi usada de forma simulada com o objetivo de proteger o patrimônio da empresa em prejuízo de terceiros, especialmente credores fiscais.
A decisão, unânime, se baseou no art. 966, inciso III, do CPC, que permite a rescisão por colusão entre as partes para fraudar a lei.
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ENTENDA O CASO
O processo teve origem em uma reclamação trabalhista na qual a metalúrgica reconheceu, sem apresentar qualquer contestação, uma dívida de mais de R$ 290 mil, somando verbas trabalhistas e honorários advocatícios. O valor foi praticamente o mesmo apontado na petição inicial. Como garantia de pagamento, a empresa indicou um imóvel que já se encontrava penhorado em diversas execuções fiscais, totalizando mais de R$ 3 milhões em débitos.
Segundo o MPT, esse comportamento não foi isolado, se repetiu em pelo menos 17 outras ações judiciais. Em todas elas, a empresa adotava o mesmo padrão: reconhecia integralmente os pedidos, indicava o mesmo imóvel como garantia mesmo sabendo que o bem já estava comprometido judicialmente, e não apresentava defesa ou impugnação de valores.
Nos autos da ação rescisória, o MPT juntou certidão da Justiça Federal comprovando a existência de 17 execuções fiscais contra a empresa entre 2005 e 2016, além de levantamento no TJ/SC, com registro de mais de 30 ações judiciais contra a metalúrgica, a maioria delas também referente a execuções fiscais promovidas pela União, pelo INSS e pelo estado de Santa Catarina.
Apesar desse cenário de grave irregularidade fiscal e do encerramento das atividades empresariais, a empresa firmava acordos reconhecendo dívidas expressivas sem qualquer resistência. O comportamento foi apontado como estratégia para utilizar os créditos trabalhistas - de natureza preferencial - como escudo contra execuções fiscais, configurando o que a relatora classificou como desvio de finalidade do processo judicial.
Embora a existência de vínculo de emprego tenha sido reconhecida, o MPT sustentou que o uso reiterado da prática revelava simulação processual. Em primeira instância, o TRT da 12ª região julgou a ação rescisória improcedente, sob o entendimento de que não havia provas robustas de fraude.
CONLUIO E FRAUDES REITERADAS
Para a relatora, ministra Morgana de Almeida Richa, embora houvesse vínculo empregatício entre a ex-funcionária e a metalúrgica, o conjunto de indícios colhidos na ação rescisória evidenciou o uso do processo com finalidade diversa da solução legítima de conflito. A ministra destacou que a atuação das partes, especialmente da empresa, revelou ausência de pretensão resistida e indicou um padrão processual voltado à blindagem patrimonial.
Ela também ressaltou que, embora seja difícil comprovar diretamente o intuito fraudulento, a jurisprudência do TST admite o uso de provas indiciárias, desde que consistentes. Segundo o acórdão, a conduta da empresa buscava viabilizar a preferência dos créditos trabalhistas frente a outros débitos, em especial fiscais, de modo a frustrar a atuação do Fisco e de outros credores.
Entre os elementos analisados, a relatora considerou:
A relação extraprocessual das partes e a atuação processual coordenada;
A existência de dívidas fiscais significativas da empresa (mais de 30 execuções fiscais registradas);
O reconhecimento integral de valores expressivos, sem contestação;
A indicação recorrente do mesmo imóvel como garantia, este que já estava constrito em execuções movidas pela União, pelo INSS e pelo Estado.
No caso específico, o valor da causa ultrapassava R$ 300 mil, e a empresa reconheceu quase integralmente a dívida já na audiência inicial, sem qualquer resistência ou apresentação de provas. O imóvel indicado como garantia - sede da empresa - já estava comprometido por diversas penhoras, conforme demonstrado em certidões anexadas pelo MPT.
"Do exame dos autos, extrai-se que a empresa, embora estivesse em situação financeira irregular (...), entabulou acordo reconhecendo como devida a quase integralidade do elevado valor postulado na petição inicial, (...) No próprio ato, também a empresa ofereceu em garantia justamente o imóvel que era já objeto de diversas constrições judiciais em execuções fiscais, constituindo crédito privilegiado em relação ao Fisco. O comportamento da empresa repetiu-se concomitantemente em diversas outras reclamações trabalhistas, todas com o mesmo 'modus operandi'."
A ministra também observou que a tentativa de conciliação em bloco com outros empregados - e com o mesmo advogado -, seguida da homologação rápida dos acordos, reforçava o caráter simulado da controvérsia.
Com base nesses elementos, o colegiado reconheceu a ocorrência de colusão, nos termos do art. 966, inciso III, do CPC. Aplicando a OJ 94 da SDI-2, que prevê a extinção do processo original nos casos de simulação processual, o TST julgou procedente a ação rescisória e anulou a sentença homologatória, extinguindo a reclamação trabalhista sem resolução de mérito. A decisão foi unânime.
Processo: 1249-59.2022.5.12.0000 - Leia o Acórdão.
FONTE: BOLETIM MIGALHAS Nº 61591, DO DIA 08 08 2025.
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