RESPONSABILIDADE
SUBSIDIÁRIA DO DONO DA OBRA À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA DO TST
* Sabrina
Soares Piau – Advogada.
Este artigo trata da mudança no
entendimento do Tribunal Superior do Trabalho acerca da responsabilidade do
dono da obra e do empreiteiro em relação aos trabalhadores atuantes na
construção civil, e de que forma deve ser provada.
1.
Entendimento pacificado pelo TST desde 2011.
O tema vergastado anteriormente fora
regido pela OJ 191 da SBDI-1 do TST,
sob o entendimento de que ao se tratar de construção civil, o dono da obra não
arcaria com responsabilidade solidária ou subsidiária acerca dos trabalhadores
que laboraram na obra, recaindo a dita obrigação sobre o empreiteiro.
Tal entendimento se justificava em
razão do dono da obra geralmente sequer conhecer os pedreiros e demais
trabalhadores encarregados da construção, estes são diretamente contratados
pelo empreiteiro e a ele se reportam, justificando sua responsabilidade direta
sobre esses contratos.
OJ. SDBI-1. 191. CONTRATO DE
EMPREITADA. DONO DA OBRA DE CONSTRUÇÃO CIVIL. RESPONSABILIDADE (nova redação) – Res. 175/11, DEJT divulgado
em 27, 30 e 31/5/11
Diante da inexistência de previsão
legal específica, o contrato de empreitada de construção civil entre o dono da
obra e o empreiteiro não enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas
obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, salvo sendo o dono da obra
uma empresa construtora ou incorporadora.
2. Mudança
de entendimento acerca da responsabilidade trabalhista do dono da
obra.
Entretanto, a recente decisão colegiada
firmada pela Seção de Dissídios Individuais 1 do Tribunal Superior do Trabalho
suscitada em incidente de Recurso Repetitivo, de caráter vinculante mudou o entendimento existente na OJ 191 acerca
da responsabilidade do dono da obra.
Ocorre que sob o entendimento anterior,
caso o empreiteiro não realizasse os pagamentos e demais obrigações contratuais
a contento e não tivesse como arcar com eventual execução trabalhista, os
trabalhadores ficavam prejudicados.
Partindo dessa análise, constatou-se
que o dono da obra de fato não tem obrigação direta com os trabalhadores,
porém, tem obrigação de escolher bem o empreiteiro, já que os contratos com os
demais derivam dessa relação inicial.
Assim, sob os preceitos da nova
análise, o dono da obra passa a ser subsidiariamente responsável pelas
obrigações trabalhistas advindas da obra caso comprovada contratação de
empreiteiro sem idoneidade econômico financeira.
Segue entendimento
para conhecimento:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. EFEITO
MODIFICATIVO. INCIDENTE DE RECURSO DE REVISTA REPETITIVO. TEMA 0006. CONTRATO
DE EMPREITADA. DONO DA OBRA. RESPONSABILIDADE. DECISÃO DE CARÁTER VINCULANTE.
MODULAÇÃO DOS EFEITOS 1. A SDI1 do TST.
1: No julgamento de recurso de revista repetitivo,
firmou a tese de que, excepcionados os entes públicos da Administração direta e
indireta, o dono da obra é subsidiariamente responsável por obrigações
trabalhistas não adimplidas do empreiteiro que contratar sem idoneidade
econômico-financeira, por aplicação analógica do artigo 455 da CLT e com fundamento em CULPA IN ELIGENDO.
2: Mudança de paradigma a impactar diretamente a
atual diretriz sufragada na OJ 191 do
TST, no que, sem qualquer distinção, afasta a responsabilidade do dono da
obra por obrigações decorrentes dos contratos de trabalho firmados com o
empreiteiro.
3: Necessidade de modulação dos efeitos da decisão
proferida sob a sistemática de recursos repetitivos, ante a profunda
repercussão jurídica, econômica e social de seu conteúdo, sob pena de
vulneração à segurança jurídica das relações firmadas à luz de entendimento
jurisprudencial até então pacificado no Tribunal Superior do Trabalho. Aplicação dos artigos 896-C, § 17, da CLT e
17 da instrução normativa 38/15 do TST.
4: Embargos de declaração providos para, ao sanar
omissão, mediante a atribuição de efeito modificativo, acrescer ao acórdão
originário a tese jurídica 5, de seguinte teor: “5ª) O entendimento contido na tese jurídica 4 aplica-se exclusivamente
aos contratos de empreitada celebrados após 11 de maio de 2017, data do
presente julgamento”.
(TST PROCESSO
TST-ED-IRR-190-53.2015.5.03.0090, ACÓRDÃO SBDI-1, INCIDENTE EM RECURSO
REPETITIVO, CARÁTER VINCULANTE, DATA DO JULGAMENTO 9/8/18, DATA DA PUBLICAÇÃO
15/10/18)
Cabe ressaltar que o ônus de provar a
referida idoneidade econômico financeira fica a cargo do autor da ação.
O referido entendimento já está sendo
utilizado como base para decisões recentes, como demonstra a ementa abaixo
transcrita, datada de fevereiro de 2019, que embora não tenha condenado o
dono da obra utilizou do entendimento para análise do caso:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE
SUBSIDIÁRIA AFASTADA. DONO DA OBRA. CONTRATO DE EMPREITADA DE CONSTRUÇÃO CIVIL,
EMPRESA DONA DA OBRA NÃO É CONSTRUTORA OU INCORPORADORA.
MÉRITO
Eis o teor do
despacho denegatório:
PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA/SUBSIDIÁRIA /
TOMADOR DE SERVIÇOS/TERCEIRIZAÇÃO / EMPREITADA / DONO DA OBRA.
Alegação (ões): contrariedade à Súmula 331, item IV e V do Tribunal
Superior do Trabalho. Violação:
Consolidação das Leis do Trabalho, artigo 455. Insurge-se o Reclamante contra o
Acórdão Regional que afastou a responsabilidade subsidiária da 2ª e 3ª
Reclamadas. Refuta a tese de dona da obra adotada pela Turma e alega que
restaram evidenciadas as CULPAS IN ELIGENDO E IN VIGILANDO das Recorridas. Consta do
Acórdão:
"[...] In casu, como visto, foi celebrado contrato de id 94a763f - Pág. 2 entre as Reclamadas
TEN - TORRES EÓLICAS DO NORDESTE S.A e CONSTRUTORA S.O.S LTDA, para
fornecimento de mão de obra para serviços de construção civil para implantação
da fábrica de Torres Eólica.
Nos termos da OJ 191 da SDI-1 do TST interessa saber se o contrato é de
empreitada de construção civil, e se a dona da obra é construtora ou
incorporadora, o que não é o caso da Reclamada TEN - TORRES EÓLICAS DO NORDESTE
S.A. Enfim, a hipótese dos autos demonstra a existência de um contrato de
empreitada de construção civil, o que atrai a aplicação das diretrizes da OJ 191 da SDI-1 do TST. Apenas nos
casos de prestação de serviços é que se aplica o entendimento constante da Súmula 331 do TST. [...]
Sendo assim, forçoso concluir que a
Reclamada TEN - TORRES EÓLICAS DO NORDESTE S.A não possui responsabilidade
subsidiária. Por conseguinte, também, deve ser afastada a responsabilidade
subsidiária da Reclamada ANDRADE GUTIERREZ ENGENHARIA S.A. Isso porque ela é
acionista da Reclamada TEN - TORRES EÓLICAS DO NORDESTE S.A, conforme comprova
Ata de Assembleia Geral de 11/8/14. Segundo porque, na defesa, ela nega a
prestação de serviços pelo Autor em seu favor. E, negada a prestação de
serviços pela segunda Reclamada, cabia ao empregado demonstrar que foi
contratado para prestar serviços em prol daquela. Ocorre que o Reclamante não
conseguiu se desvencilhar do ônus da prova da alegação de que prestou serviços
em benefício da segunda Reclamada.".
O julgamento está em sintonia com a OJ 191 da SDI-I do TST, cujo
entendimento foi ratificado pela referida Subseção no julgamento do IRR 190-53.2015.5.03.0090, o que
inviabiliza o seguimento do Recurso, consoante regra do artigo 896, §7º, da CLT e Súmula 333 do TST.
Verifica-se ainda que o entendimento da
Turma Regional não traduz qualquer violação dos dispositivos legais invocados,
inviabilizando a admissibilidade do Recurso de Revista. Ademais, para se chegar
a uma conclusão diversa, necessário seria o reexame de fatos e provas, o que
encontra óbice na Súmula 126 do TST
e inviabiliza o seguimento do Apelo. CONCLUSÃO.
DENEGO seguimento ao Recurso de Revista.
(TST-AIRR: PROCESSO
N. 0010447.92.2015.5.05.0281, DATA DO JULGAMENTO: 13/2/19, DATA DA PUBLICAÇÃO
15/2/19)
3. Conclusão
Como demonstrado, o entendimento
jurisprudencial acerca da responsabilidade por encargos trabalhistas na
construção civil foi modificado, o que representa um avanço na proteção ao
trabalhador, passando a recair sobre o dono da obra a responsabilidade
subsidiária caso comprovada contratação do empreiteiro sem idoneidade
econômico-financeira, sob ônus da prova do autor.
__________________________.
*Sabrina Soares Piau é advogada, graduada pela Universidade do Distrito
Federal-UDF e pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela ATAME.