STF
VALIDA EMENDA QUE AUTORIZA CONTRATAÇÃO CELETISTA DE SERVIDORES PÚBLICOS

Para maioria dos
ministros não houve vício no processo legislativo que alterou norma
constitucional.
Nesta
quarta-feira, 6.10.2024, STF declarou, por maioria, a constitucionalidade da EC
19/98, que flexibilizou o regime jurídico único dos servidores públicos,
possibilitando a contratação pela modalidade CLT. Ficou vencida a relatora,
MINISTRA CÁRMEN LÚCIA e os MINISTROS EDSON FACHIN e LUIZ FUX.
O Ministro
NUNES MARQUES suspende debate sobre extinção do RJU
O Tribunal,
considerando o extenso período transcorrido desde a concessão da medida
cautelar pela relatora, que suspendia a emenda, decidiu que a eficácia da
decisão será ex nunc - isto é, válida apenas a partir deste momento -, visando
garantir a segurança jurídica e preservar o interesse social.
Adicionalmente,
foi determinada a vedação de mudanças de regime para os servidores atuais,
visando evitar possíveis complicações administrativas e previdenciárias.
REGIME
JURÍDICO ÚNICO
Criado
pela Constituição de 1988 (art. 39), o regime jurídico único previa a
unificação da forma de contratação e o tratamento jurídico dos servidores
públicos, conferindo-lhes, geralmente, estabilidade no cargo após período
probatório, além de direitos específicos, como aposentadoria diferenciada e
garantias de permanência no serviço público.
Ele
padronizava as relações de trabalho dos servidores da administração direta,
autarquias e fundações públicas, diferenciando-os dos trabalhadores do setor
privado, que seguem a CLT.
A EC
19/98 flexibilizou essa regra, permitindo que servidores públicos sejam
contratados tanto pelo regime estatutário (próprio dos servidores públicos)
quanto pelo regime celetista (da iniciativa privada). Ela criou
conselhos de política de administração e remuneração de pessoal, compostos por
servidores designados pelos respectivos Poderes.
ENTENDENDO
O CASO
Os
partidos PT e PDT ajuizaram ação no STF argumentando que a emenda foi
aprovada sem o devido processo legislativo, violando o princípio da igualdade
ao diferenciar a forma de contratação dos servidores.
Em 2007,
o STF suspendeu os efeitos da EC 19, restabelecendo o regime
jurídico único para servidores da administração direta, autarquias e fundações.
VOTO
DA RELATORA
Em
2021, a MINISTRA CÁRMEN LÚCIA, RELATORA da AÇÃO, votou contra a
norma impugnada, seguindo a decisão do STF de 2007.
S.
Exa. ressaltou que houve irregularidades graves no processo legislativo que
alterou o regime jurídico dos servidores públicos. Apontou que, apesar de a
proposta ter sido rejeitada no primeiro turno de votação na Câmara dos
Deputados, ela foi reintroduzida em um segundo turno, prática que ela
classificou como uma "manobra" para burlar as exigências
constitucionais.
A Ministra
destacou que a emenda não atingiu o quórum de 3/5 dos votos, necessário para
aprovações desse tipo.
Para a
Ministra CÁRMEN LÚCIA, a reintrodução da proposta, após sua rejeição
inicial, violou o processo formal de reforma constitucional, em clara afronta à
decisão do plenário da Câmara no primeiro turno. Além disso, a CF veda a
reavaliação de matérias rejeitadas ou prejudicadas na mesma sessão legislativa,
norma que também foi descumprida.
CÁRMEN
relembrou que o processo foi iniciado no STF em 2000, e a decisão
cautelar só veio em 2007, após seis anos e quatro pedidos de vista. O Supremo,
na época, suspendeu os efeitos da emenda e restabeleceu o regime jurídico único
para os servidores da administração direta, autarquias e fundações públicas.
Nesse
sentido, votou pela inconstitucionalidade formal da norma.
VEJA O
VOTO DA RELATORA.
Na
quarta-feira, 06.10.2024, o Ministro EDSON FACHIN acompanhou a relatora,
afirmando que o rito constitucional para votações dessa natureza não é uma
questão interna do Legislativo.
Destacou
a relevância e gravidade da questão, que envolve a manutenção do RJU no
serviço público e a possibilidade de contratos sem regras estatutárias.
Segundo
FACHIN, a ação inicial alega incompatibilidade com dois dispositivos
constitucionais específicos (§2º e §4º do art. 60 da CF), caracterizando
o tema como constitucional e não meramente regimental.
O MINISTRO
LUIZ FUX também acompanhou a relatora.
DIVERGÊNCIA
O Ministro
Gilmar Mendes entendeu que o Legislativo apreciou a demanda nas respectivas
Casas, com as devidas fases. Dessa forma, como os procedimentos foram seguidos
e apreciados pelo Poder Legislativo, a norma não poderia ser considerada
inconstitucional, como forma de "autocontenção" do Judiciário.
O Ministro
afirmou, ao votar, que o processo legislativo seguiu etapas necessárias e que a
alteração no caput do art. 39 não violou a CF. Para o decano da
Corte, a transposição do texto do § 2º para o caput do art. 39,
após a deliberação do Parlamento, foi uma questão de ajuste redacional e não
uma modificação de mérito, pois o § 2º já havia sido aprovado com o
quórum exigido de três quintos em dois turnos.
O
ministro também abordou a autonomia das Casas Legislativas e a doutrina,
segundo a qual o Legislativo é soberano para interpretar e aplicar seus
regimentos. Citou o princípio de INTERNA CORPORIS, que impede a
interferência do Poder Judiciário em questões internas do Legislativo,
especialmente em relação à interpretação regimental.
Nesse
sentido, argumentou que a aprovação da redação final pela Comissão Especial e
pelo Plenário da Câmara dos Deputados respeitou as normas e não justificaria
intervenção judicial.
Ao
votar pela improcedência da ação, o ministro considerou que, devido ao longo
período de vigência da medida cautelar na ADIn, seria necessário
preservar a segurança jurídica. Para isso, propôs modulação dos efeitos da
decisão, atribuindo-lhe eficácia ex nunc.
Dessa
forma, segundo o ministro, evita-se o retrocesso em relação aos atos praticados
com base na legislação vigente e impede-se a transformação retroativa dos
regimes dos servidores, evitando "tumultos administrativos e
previdenciários" e garantindo a continuidade do regime atual até que
haja nova deliberação legislativa.
VEJA A
ÍNTEGRA DO VOTO.
COM A
DIVERGÊNCIA
Nesta
quarta-feira, 06.10.2024, ao votar, o Ministro NUNES MARQUES acompanhou
a divergência para afastar a inconstitucionalidade formal, destacando que o
processo legislativo foi conduzido conforme o regimento interno da casa
legislativa e dentro dos debates apropriados.
Segundo
o Ministro, o Judiciário não deve interferir em questões relacionadas ao
procedimento interno do Legislativo, pois isso envolve atos típicos da
atividade legislativa e respeita a autonomia entre os poderes.
No
mesmo sentido votou o Ministro FLÁVIO DINO. Entendeu que a análise dos
efeitos de "destaque de votação em separado", de natureza
exclusivamente regimental, não gera matéria passível de controle de constitucionalidade.
Para S. Exa., esse tipo de questão pertence ao campo regimental e não cabe ao
Judiciário avaliá-la do ponto de vista constitucional.
Os
MINISTROS CRISTIANO ZANIN, ANDRÉ MENDONÇA, ALEXANDRE DE MORAES, DIAS TOFFOLI E
LUÍS ROBERTO BARROSO também acompanharam a divergência.
PROCESSO:
ADIN 2.135