DA PROTEÇÃO à DIGNIDADE da PESSOA HUMANA.
PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL FUNDAMENTAL.
A proteção à dignidade da
pessoa humana está assentada em nosso ordenamento jurídico como sendo princípio
constitucional na forma prevista no artigo
1º, inciso III, da Carta Cidadã de 1988.
A
CONSTITUCIONALIZAÇÃO DA REPARAÇÃO POR DANO MORAL
Alçada ao status de norma
constitucional a reparação por Dano Moral recebeu enorme fôlego para a busca,
pelo cidadão, da correção devida em espécie, decorrente da ofensa aos valores da
dignidade humana. Antes, contemplado apenas no plano do Direito Civil com
fundamento em valores apreciados no plano apenas individualista, após o advento
da Carta Magna de 1988 a matéria passa a ter interesse em referência a direitos
e prerrogativas de determinados grupos, considerados frágeis e que merecem especial
proteção da lei, como por exemplo, os idosos, as pessoas portadoras de
deficiências, as crianças etc.
Nesta perspectiva, a dignidade
humana, tomada como princípio constitucional, alcança todos os setores da ordem
jurídica, e, quando em cotejo ou colisão com outros princípios, o princípio da
dignidade humana não se sujeita a ponderações.
Desse modo, em caso de
conflito entre duas ou mais situações jurídicas subjetivas amparadas por outros
princípios de igual importância hierárquica, a medida será sempre em favor do
conceito de dignidade da pessoa humana, que deverá vir à tona no caso concreto.
Ocorrendo um conflito entre
uma situação jurídica subjetiva existencial e uma situação jurídica patrimonial,
a primeira prevalece, em nome do princípio constitucional da dignidade humana (artigo 1º, III, da CF).
Assim, à luz do texto
constitucional, podemos conceituar o dano moral como aquele que “configura-se
pela alteração no bem-estar psicofísico do indivíduo”.
O Mestre Paulo Eduardo Oliveira ensina em referência ao dano moral
como dano pessoal, pois a lesão ocorre nos direitos da pessoa humana em suas
diversas “integralidades”, quais sejam, “a psicofísica, a intelectual, a moral
propriamente dita e a social” [O dano
pessoal no direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2002. p. 18.]
Destarte, ao invés da
consagrada expressão “dano moral”, preferimos a denominação “dano pessoal”, por
ser a que mais se acomoda, na seara do direito social, aos danos sofridos pela
pessoa como um todo, em sua dignidade humana.
Ressaltamos que tais danos não
são taxativos e se concretizam sempre que houver violação aos direitos de
personalidade e da dignidade humana. A respeito ensina o Mestre e
Doutrinador Yussef Said Cahali ... “[...]
tudo
aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores
fundamentais inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em
que está integrado, qualifica-se, em linha de princípio, como dano moral; não
há como enumerá-los exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia, no
sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no
desprestígio, na desconsideração social, no descrédito à reputação, na
humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da
normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste
psicológico, nas situações de constrangimento moral.” (CAHALI,
Yussef Said. Dano Moral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 20).
Na esfera cível, a integridade
psicofísica (física e moral) garante
vários direitos de personalidade, como a honra, a vida, a imagem. Em nome do
direito à vida, inclui-se o direito à saúde, previdência e assistência,
compreendidas estas como bem-estar psicofísico e social.
Também entendemos como
manutenção da integridade psicofísica o direito à existência digna e, como bom
exemplo, temos o direito à irredutibilidade dos benefícios previdenciários,
como direito fundamental, de caráter alimentar e existencial [Conforme nosso Curso de direito da
seguridade social. 7. ed. São Paulo: Saraiva, p. 81, item 2.4.].
Portanto, o que configura o
dano moral é a alteração no bem-estar psicofísico do indivíduo.
A
DISTINÇÃO ENTRE DANO MORAL E DANO PATRIMONIAL
Merece atenção a distinção
entre reparação por dano moral e reparação patrimonial.
No primeiro caso, a lesão é de
bem integrante da personalidade e causa dor, sofrimento, tristeza e humilhação
à vítima, ao passo que a lesão de ordem patrimonial gera prejuízo econômico
passível de reparação.
Comum e lamentavelmente,
deparamo-nos com decisões judiciais que confundem os dois conceitos e acreditam
que a reparação por dano patrimonial supre a indenização por dano moral.
Cabe ressaltar que o dano
moral é o efeito não patrimonial da lesão de direito e não a própria lesão.
A fim de espancar tais
equívocos, o STJ editou a Súmula nº 37, que assim prescreve:
Súmula
nº 37 do STJ:
São
cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo
fato.
O
NEXO CAUSAL NECESSÁRIO À CONFIGURAÇÃO DO DANO MORAL
A causalidade como pressuposto
da responsabilidade civil é condição “sine
qua non” para a configuração do dano moral.
O nexo causal diz respeito a
elementos objetivos, consistentes na ação (ato comissivo) ou omissão (ato
omissivo) do sujeito, nociva ao direito alheio e geradora do dano. Yussef Cahali adverte que “bastará que
se verifique que o dano não ocorreria se o fato não tivesse acontecido” [Dano e indenização. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1980].
A
REPARAÇÃO NO CÓDIGO CIVIL
Como mencionado anteriormente,
com a promulgação da CF de 1988,
possibilitou-se a reparação civil do dano moral, a dispor, em seu artigo 5º, X, serem invioláveis a vida
privada, a honra e a imagem das pessoas.
Aqui, ao contrário do dano
material, busca-se, diante da impossibilidade de recomposição do status quo,
uma compensação pecuniária de forma a amenizar a dor sofrida pela vítima.
Para isso, devem ser levados
em conta, havendo o nexo causal, a intensidade do ânimo de ofender, o grau da
dor, a duração do sofrimento. Como é o nexo causal que delimita a extensão da
reparação, é fundamental definir se os reflexos da ofensa atingem o patrimônio
ou o moral do ofendido.
Isto porque há casos de lesão
moral que podem atingir o patrimônio do ofendido (quando a ofensa à honra
resulta em danos materiais) e há casos de lesão material que atingem direitos
de personalidade do ofendido.
Em nosso Código Civil, os
direitos de personalidade estão inscritos no Capítulo II, artigos 11 a 21.
Dispositivos que, basicamente,
estabelecem que se pode atuar no sentido de obstar qualquer atentado ao direito
de personalidade (não só atentado, mas a
própria ameaça de lesão) com admissão, inclusive, de ressarcimento em vista
das perdas e danos.
Com efeito o Código Civil em seu artigo 186, ao
tratar dos atos ilícitos, assim disciplina:
Aquele que, por ação ou
omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a
outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
O
VALOR DA REPARAÇÃO POR DANO PESSOAL - AUSÊNCIA DE CRITÉRIOS LEGAIS PARA A
FIXAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO
Em nosso ordenamento jurídico não
há disciplina de regulamentação legal para a fixação do valor do ressarcimento
do dano moral, o que resulta em indenizações calculadas por arbitramento.
Diante dessa ausência de
critérios legais para a fixação do valor da indenização por dano moral,
escolhemos a corrente que adota o caráter compensatório, na qual a vítima deve
ser indenizada de forma mais ampla e possível, diante da impossibilidade de recomposição
do status quo, de modo a amenizar a dor sofrida, segundo o princípio que
consagra: “na dúvida, em favor do ofendido”.
Sendo assim, o primeiro e
maior aspecto a ser considerado para aferir a extensão da lesão em sede da
reparação do dano moral, é a dignidade humana atingida.
Veremos um exemplo
interessante extraído da Jurisprudência em que a lesão decorrente resulta de
fato usual das relações de consumo em nosso dia a dia:
Administrativo.
Corte no fornecimento de energia elétrica. Prova do dano moral. Suficiência da
demonstração do ato ilícito. Remessa dos autos ao tribunal de origem. 1. Interposto o recurso pela alínea c e
admitido, cumpre ao Tribunal eleger a tese prevalente e, incontinenti, rejulgar
a causa. 2. É cediço na Corte que,
“como se trata de algo imaterial ou ideal, a prova do dano moral não pode ser
feita por meio dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material.
Por outras palavras, o dano moral está ínsito na ilicitude do ato praticado,
decorre da gravidade do ilícito em si, sendo desnecessária sua efetiva
demonstração, ou seja, como já sublinhado: o dano moral existe in re ipsa”.
Afirma Ruggiero: “Para o dano ser indenizável, ‘basta a perturbação feita pelo
ato ilícito nas relações psíquicas, na tranquilidade, nos sentimentos, nos
afetos de uma pessoa, para produzir uma diminuição no gozo do respectivo
direito’”. (REsp 608918/RS, 1ª T., Rel.
Min. José Delgado, DJ 21.06.2004)
Assim, em referência aos danos
morais, pacificado está em aplicação da jurisprudência dos nossos Tribunais, o
entendimento no sentido de que não há necessidade de efetiva comprovação do
dano, mas tão somente do fato deflagrador do sofrimento ou angústia vivida pela
vítima de tal ato ilícito, pois que existem fatos que, por si só, permitem a
conclusão de que a pessoa envolvida sofreu constrangimentos capazes de serem
reconhecidos como danos morais.
Veremos um caso também
extraído da Jurisprudência, de natureza Previdenciária:
Previdenciário.
Agravo legal. Erro no cálculo do salário-de-benefício. Fácil constatação.
Pedido administrativo de retificação. Desídia na apreciação. Peculiaridades do
caso. Dano moral. Ocorrência. I - A parte autora postulou administrativamente a reparação de erro
no cálculo da renda mensal inicial do seu benefício, de fácil constatação, e
que poderia ter sido tratado como mero erro material e prontamente retificado
naquela ocasião. Caso tivesse procedido à devida retificação, não haveria se
falar em dano ao autor, pois que no exercício da importante função que
desempenha, e da grande demanda de atendimentos, a autarquia previdenciária
está sujeita à prática de erros, tal qual o cometido. II - A sucessão de falhas e omissões é que confere peculiaridade ao
caso, porquanto não foi apenas o equívoco no ato concessório que gerou efeitos
danosos ao segurado, mas sim, e principalmente, a desídia do agente da
Autarquia na análise do pedido de retificação daquele. III - Restou comprovado o ato danoso ao autor, pois que recebeu
benefício no valor de um salário-mínimo, desde a concessão (12.01.1995, f. 46),
ao passo que tem direito à percepção de quantia maior, em consonância com os
salários-de-contribuição recolhidos. Também se evidencia a omissão do agente da
Autarquia Previdenciária, que, diante da possibilidade de reparação do erro
apontado, emitiu resposta padronizada e desprovida de conteúdo veraz. IV - No que se refere aos danos morais,
é pacificado em nossa jurisprudência o entendimento no sentido de que não há
necessidade de efetiva comprovação do dano, mas tão somente do fato deflagrador
do sofrimento ou angústia vivida pela vítima de tal ato ilícito, pois que
existem fatos que, por si só, permitem a conclusão de que a pessoa envolvida
sofreu constrangimentos capazes de serem reconhecidos como danos morais. V - Agravo legal do INSS não provido. (TRF
3ª R., Agravo Legal em Apelação Cível nº 0002424-14.2001.4.03.6126/SP, publ.
21.03.2013)
DA
PRESCRIÇÃO DO PEDIDO DE REPARAÇÃO POR DANO MORAL
Nos termos do art. 206, § 3º,
V, do novo Código Civil, a pretensão de reparação civil prescreve em 3 (três)
anos. Entretanto, entendemos que os direitos fundamentais são imprescritíveis.
DA
COMPETÊNCIA PARA AJUIZAMENTO DA AÇÃO
Colacionamos a seguir arestos
que consubstanciam entendimento do Superior Tribunal de Justiça e do TRF da 3ª
Região a respeito do juízo competente para ingresso de ação previdenciária
cumulada com dano moral.
STJ:
Processo
civil. Conflito de competência. Ação de indenização por dano moral. Ato
administrativo praticado pelo Instituto Nacional de Seguridade Social - INSS. 1.
Tratando-se de ação de reparação por
dano moral que tem como fundamento ato administrativo, supostamente indevido,
praticado pelo INSS, é competente para o seu processamento e julgamento a
Justiça Federal Comum, por não se tratar na hipótese de demanda relativa a
benefício previdenciário ou dano material ou moral decorrente de acidente de
trabalho. 2. Conflito conhecido para
declarar competente a Justiça Federal Comum da Seção Judiciária do Estado de
São Paulo. (STJ, CC 54773/SP, Proc.
2005/0150525-0, 1ª S., Relª Min. Eliana Calmon, DJ 08.02.2006, publ.
06.03.2006, p. 136)
Caso em que a ação é proposta
na Justiça Estadual:
Processual
civil e previdenciário. Conflito negativo de competência. Justiça Estadual e
Justiça Federal. Concessão de aposentadoria por idade cumulada com indenização
por danos morais. Art. 109, § 3º, da CR/1988. Foro. Opção pelo segurado.
Competência da Justiça Estadual. Suscitado. 1. Extrai-se dos autos que o pedido do autor consiste na concessão
de aposentadoria por idade, bem como na condenação do INSS ao pagamento de
indenização por danos morais. 2. O
autor optou pela Justiça Estadual localizada no foro de seu domicílio, que, por
sua vez, não possui Vara Federal instalada, nos termos do art. 109, § 3º, da
CR/1988. 3. Entende esta Relatoria
que o pedido de indenização por danos morais é decorrente do pedido principal,
e a ele está diretamente relacionado. 4.
Consoante regra do art. 109, § 3º, da CR/1988, o Juízo Comum Estadual tem sua
competência estabelecida por expressa delegação constitucional. 5. Conflito de competência conhecido
para declarar a competência do Juízo de Direito da 1ª Vara de Registro/SP. (CC 2010/0064333-5, Proc. 111447/SP, 3ª S.,
Rel. Min. Celso Limongi (Desembargador Convocado do TJSP) (8175), DJ
23.06.2010, DJe 02.08.2010)
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